Ponto de Vista

Inovar para educar e educar para inovar

Por Esther Carvalho (texto publicado no Perfil Econômico | 05 de abril de 2015)

Uma criança que ingressa hoje, na escola, com dois anos incompletos, na chamada série do Minimaternal, concluirá o correspondente ao Ensino Médio em 2031. E existe uma dificuldade grande em se projetar a escola necessária para ela. Não se tem claro, ainda, que currículo será necessário para que essa criança seja um cidadão pleno e competente, que profissões serão demandadas, que contexto global pode ser projetado. A despeito do que não se sabe, é necessário fundamentar a formação das novas gerações naquilo que já se sabe e projetar um futuro que será construído, também, no presente. O fato é que é necessário inovar para educar.

Já se sabe, por exemplo, que conteúdos não devem ser fim em si mesmos. Devem ser o instrumento para o desenvolvimento de competências cognitivas e competências socioemocionais. Dentre as cognitivas encontram-se: interpretação, reflexão, conceituação, racionalização, conexão de informações, memorização, relação de causa e efeito, dentre outras. As socioemocionais são aquelas ligadas à resiliência, criatividade, colaboração, autocontrole, entusiasmo.

Sabe-se, também, por meio da neurociências aplicada à educação, que o cérebro tem uma imensa plasticidade para restabelecer conexões e novas aprendizagens, assim como a o papel fundamental da emoção para se aprender. Com tecnologias da informação e da comunicação pode-se criar diversos ambientes e utilizar várias linguagens, atendendo os diferentes estilos de aprendizagem.

Inovar é, portanto, imperativo para que se possa oferecer uma escola interessante, competente, com espaços de aprendizagem ricos de estímulos e possibilidades, com propostas diversificadas de trabalho entre alunos, estes vistos como protagonistas da sua aprendizagem e com o professor atuando como mediador e orientador desse processo de aprender e de ensinar. Esse professor, ao planejar sua aula, deve projetar não o que ele estará fazendo mas, principalmente, o que o aluno estará fazendo durante seu curso.

Sob a perspectiva de se formarem pessoas inovadoras, cabe destacar o papel preponderante da educação no que se refere ao desenvolvimento de competências que favorecem a atitude inovadora, num mundo complexo, de rápidas mudanças. É necessário educar para inovar.

No segundo semestre do ano passado foi publicado o Índice Global de Inovação 2014, uma iniciativa da Universidade de Cornell (EUA), do ENSEAD , escola de administração francesa, e da World Intellectual Property Organization (WIPO), agência especializada da Organização das Nações Unidas, ONU. O relatório, sob o tema Fator Humano em Inovação, explora o papel dos indivíduos e dos grupos por detrás do processo de inovação. Esse, por sua vez, é destacado como importante propulsor do desenvolvimento econômico, da equidade social e do bem estar. O documento busca romper com uma análise unidimensional da inovação, adotando uma visão multifacetada desse conceito, aplicável tanto a economias desenvolvidas quanto emergentes.

No ranking de inovação, estabelecido entre 143 países, o Brasil está em 61º lugar, melhorando três posições com relação ao ano de 2013, quando estava em 64º de um total de 142 países. Numa escala de 0 a 100 pontos, o país obteve a pontuação de 36,3, igual ao do ano anterior. No indicador denominado educação superior, o Brasil encontra-se em 120º e na proporção de graduados em ciência e em engenharia está em 96º.

Segundo o documento, a existência de trabalhadores com excelentes níveis de formação acadêmica é fundamental , mas não suficiente para se construir uma sociedade inovadora. Criatividade, pensamento crítico, abertura para assumir riscos, pensamento empreendedor são tão ou mais importantes do que os conhecimentos técnicos. Além dos atores ligados à inovação, é necessário uma sociedade com pessoas que sejam informadas, tenham curiosidade e imaginação para adaptar bens e serviços às suas próprias necessidades.

Não é uma tarefa trivial proporcionar, por meio da Educação, ambientes que favoreçam o desenvolvimento dos fatores humanos por trás da inovação. No relatório, Richard Scott e Stéphan Vincent-Lancrin, do Diretório de Educação e Competências da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, OCDE, identificam a educação e o desenvolvimento de competências como elementos basilares para se promover a inovação. Não basta a aquisição de excelentes conhecimentos, mas sua aplicação numa série de contextos e o desenvolvimento de competências mais complexas de serem mensuradas, como, por exemplo, a criatividade.

Políticas públicas, voltadas ao desenvolvimento da inovação, não devem se ater apenas às disciplinas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM). Uma visão mais abrangente desse conceito reconhece a contribuição de um amplo conjunto de disciplinas e competências como, por exemplo, os diferentes tipos de Artes para fomentar a inovação.

Aspecto importante a ser destacado é que performance em exames ou testes padronizados não necessariamente estão associados às competências que são importantes para a inovação. O relatório cita o exemplo do Brasil, Chile e Estados Unidos, em que as escolas com as melhores notas de seus países em Ciências no PISA, Programa Internacional de Avaliação do Aluno da OCDE, apresentam baixo nível de interesse dos alunos por essa área. Segundo o relatório, esse aspecto sugere que o modelo de ensino nesses países pode estar desenvolvendo o conhecimento acadêmico da área, mas não está despertando o interesse ou a curiosidade dos alunos. Comprometimento e motivação são elementos chaves para o desenvolvimento de competências necessárias à inovação.

O relatório destaca, ainda, que a forma como o professor ensina é tão importante quanto o que ele ensina. Portanto, inovar para educar e educar para inovar representam partes de um ciclo virtuoso que pode mudar, positivamente, a vida de pessoas, de comunidades, de sociedades, do mundo.

 

Ponto de Vista
Esther Carvalho
Diretora-Geral do Colégio Rio Branco