Ponto de Vista
O que podemos aprender com a Finlândia?
Por Esther Carvalho
Finlândia, país europeu com pouco mais de 5 milhões de habitantes e com menos de cem anos de independência, tem chamado a atenção de todo o mundo ao destacar-se, desde 2000, nos resultados do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes). O PISA, programa de avaliação comparada, é produzido pela OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento dos Países Europeus ) e aplicado nos países membros e convidados, dentre eles, o Brasil. Seu objetivo é criar indicadores sobre a efetividade de sistemas educacionais após o término da Educação Básica. Avalia, a cada três anos, as competências dos jovens em Letramento, Matemática, Ciências, Solução de problemas e, recentemente, a aplicação de Tecnologias da Comunicação e da Informação.
Razões históricas estão na origem da proficiência em leitura dos cidadãos finlandeses. A Finlândia foi parte do reino da Suécia desde o século XII ao início do século XIX. No século XVI, o rei sueco Gustav Vasa oficializou a igreja luterana como a igreja nacional finlandesa. Ler a Bíblia em sua própria língua era um dos princípios preconizados e um dos requisitos a ser cumpridos. Para se casar, era preciso que os indivíduos soubessem ler. Portanto, há muito tempo, saber ler é um valor nessa sociedade.
Guardadas as questões essenciais relativas às dimensões territoriais, à escala do sistema educacional, às razões históricas e culturais que promoveram a valorização da leitura e muitos outros aspectos que possam justificar tanta diferença entre a Finlândia e o nosso Brasil, o que podemos aprender com esse país tão bem sucedido na formação de suas crianças e jovens?
Em primeiro lugar, o prestígio social da profissão docente. Esse prestígio social não está, diretamente, relacionado a salário - situado um pouco abaixo da média dos países da OECD e da própria União Europeia. A importância de ser professor contagia jovens a ponto de ser uma das carreiras mais procuradas, perdendo apenas para a Medicina. Na proporção de 10 candidatos por vaga, anualmente, as universidades realizam exames minuciosos, incluindo prova oral, para selecionar os mais motivados e talentosos candidatos. Buscam identificar, inclusive, um elemento fundamental para que o professor exerça seu papel com plenitude: a vocação.
A formação do professor é outro aspecto que merece destaque. Formação primorosa, baseada no conceito de professor como pesquisador, é composta por cinco anos de escolarização: 3 anos de Bacharelado e 2 anos de Mestrado. Intercalando estudos na universidade e prática nas escolas, organiza-se a experiência do professor de uma maneira diferenciada da que conhecemos em nossos currículos, no Brasil. Atuando em parceria com as chamadas Escolas de Treinamento de Professores, as universidades proporcionam dois semestres de imersão em escolas de educação básica, em que todos, sem exceção, sentem-se responsáveis pela formação daquele estudante/professor. É comum, numa sala de aula, encontrarmos o professor titular, dois professores estudantes e o professor de Educação Especial, se necessário. Todos, atuando de maneira sintônica, revezam a responsabilidade sobre o trabalho a ser executado. Após um semestre de prática, o aluno retorna para a universidade para aprofundar-se na teoria. Esse movimento se repete, mais uma vez, antes da conclusão do seu mestrado. Essa formação de cinco anos se aplica a professores polivalentes (das primeiras séries do nosso Ensino Fundamental) aos especialistas das diferentes áreas do conhecimento. Os professores da Educação Infantil, apesar de não serem obrigados a fazer o mestrado, em sua grande maioria, realizam os estudos de cinco anos. No total são 300 ETCS (do português Sistema Europeu de Transferência de Créditos), de acordo com o Tratado de Bolonha, correspondentes a 8 100 horas de formação desenvolvidas em período integral.
Fenômeno interessante tem ocorrido com os egressos dos cursos de Educação. Por se tratar de profissionais altamente qualificados e motivados, passaram a despertar atratividade para outras áreas do mercado, como serviços e indústrias - a Nokia, por exemplo.
As reformas educacionais que, desde 1968, vêm imprimindo esse invejável padrão de qualidade, estão baseadas em alguns princípios: a boa escola para todos e não para alguns; a reforma como evolucionária e não revolucionária, procurando conservar e inovar; o vínculo político, cultural e econômico com a educação e a construção de diretrizes baseadas no conhecimento, na experiência de profissionais e, com profundidade, na realidade das escolas.
Numa conferência na Universidade de Helsinki, em outubro de 2009, Jari Koivisto, Conselheiro do Finnish National Board of Education, mencionou que a chave para o sucesso da educação na Finlândia está ligada à confiança e ao suporte entre três principais elementos: sistema educacional abrangente, que fornece educação inclusiva e coerente para crianças de 6 a 16 anos; suporte individual, intervenção e apoio ao aluno; professores valorizados, com alta competência técnica, motivação e formação de ponta. Segundo ele, respeito é o coração da Educação: respeito pela individualidade de cada aluno, respeito pelo processo de aprendizagem, respeito pela profissão de professor e respeito pela força da Educação.
No mês em que se comemora o Dia do Professor e nos faz refletir sobre os desafios da profissão, da formação de educadores, da educação de qualidade destinada a todos no nosso país, é importante olhar, com otimismo, os caminhos seguidos por outros países e, a partir do que somos, buscar traçar nossos próprios. Um bom começo é o sentido de respeito vinculado à Educação.
Esther Carvalho
Diretora-Geral do Colégio Rio Branco