Ponto de Vista

Ambientes de aprendizagem para o futuro – diálogo entre educadores e arquitetos

Por Esther Carvalho

Pensar a educação no e para o mundo contemporâneo faz com que emerjam novas questões, novas necessidades, novos conceitos, novos desafios. Dentre esses aspectos, surge a questão do papel do ambiente físico da escola como um elemento que influencia o processo de ensino e aprendizagem.

Aprofundando esse assunto, ocorreu em Harvard, entre dias 10 e 12 de abril último, programa realizado pela Faculdade de Educação (HGSE) e Faculdade de Arquitetura (HGSD). O evento reuniu profissionais da área de arquitetura e design e de diferentes setores da educação, oriundos de vários países, como Austrália, Canadá, Colômbia, Estados Unidos, Hong Kong, Índia, Polônia. O Colégio Rio Branco, da Fundação de Rotarianos de São Paulo, foi marcado como a única representação do Brasil no evento.

Profissionais e pesquisadores renomados, de ambas as áreas, trouxeram contribuições importantes para o curso. Dentre eles, destacam-se prof. dr. Daniel Wilson, pesquisador do Projeto Zero, da Universidade de Harvard; profª.dra. Edith Ackerman, cientista convidada do MIT, da área de desenvolvimento cognitivo; Frank Locker, arquiteto com expertise em planejamento e desenvolvimento de projetos de instalações educacionais.

Segundo o prof. Daniel Wilson, um dos coordenadores do curso, o objetivo do programa foi buscar as próximas práticas e não as melhores práticas. A proposta se traduziu em discussões de como podem ser moldadas novas visões de ambientes aprendizagem pelas últimas pesquisas e práticas em: teoria arquitetônica e aprendizagem; tecnologias emergentes; ambientes sustentáveis; colaboração da criança e do adulto, assim como da comunidade.

A interlocução entre arquitetura, pedagogia e cultura ampliou, significativamente, o repertório de todos os participantes. Além disso, como colocou professor da Jonathan Levi, arquitetos e educadores têm que se aproximar, pois, nem sempre, um consegue entender a necessidade do outro: o arquiteto não entende de fundamentos e propostas educacionais das instituições e os educadores e administradores precisam ter as ideias tangibilizadas por recursos que permitam que eles visualizem o que é proposto. Modelagem 3 D, por exemplo, é um excelente recurso para ajudar nessa interlocução.

Sob a perspectiva educacional, Patt Maes, do Laboratório de Interfaces Fluídas do MIT (Massachussets Institute of Technology), apresentou as recentes pesquisas em tecnologias emergentes, que terão impacto nos ambientes educacionais nos próximos anos. Edith Ackerman abordou o tema Mentalidades Emergentes na Era Digital; Daniel Wilson destacou a importância do espaço escolar voltado para a colaboração e Shari Tishman, também pesquisadora do Projeto Zero, da Universidade de Harvard, abordou questões sobre como teorias de aprendizagem são visíveis no design físico e pedagógico dos ambientes de aprendizagem.

As escolas, em geral, caracterizadas por salas de aula e corredores, precisam ser repensadas, no sentido de proporcionar espaços flexíveis com diferentes possibilidades de aproveitamento e práticas educativas. Corredores, locais de refeição, bibliotecas ou centros de mídias, salas de professores e administradores precisam atender a novos paradigmas educacionais.

Com tantas escolas e salas de aula consideradas tradicionais, espalhadas pelo mundo, emerge a necessidade de se repensar os espaços existentes e buscar soluções criativas que deem suporte a novas práticas educacionais. Tanto na reforma quanto na construção de novas instalações, há que se considerar que um prédio, que tem uma vida útil de 40/50 anos, deve ser flexível o suficiente para acompanhar as necessidades educacionais futuras. São trazidas para o projeto demandas educacionais que devem ser consideradas nos espaços: reflexão e aprofundamento individual; trabalho colaborativo; experiências práticas; visibilidade da produção dos alunos; momentos de reflexão em grupo convergindo para determinado tema, dentre outros. Salas organizadas em carteiras alinhadas em fileiras de alunos voltadas para o professor, estão distantes das necessidades de nossas crianças e jovens e, o mais desafiador, as mudanças físicas devem estar vinculadas às mudanças de paradigmas e práticas de sala de aula.

Franck Locker, Jonathan Levi e David Stephen destacaram que o projeto, seja de construção ou de reforma, deve partir da visão e de fundamentos pedagógicos, envolver todos os stakeholders, em especial os professores. Sinalizaram, ainda, que as definições e as tomadas de decisão devem ser claras e comunicadas entre os envolvidos. O investimento nessas fases preliminares do projeto geram clareza da proposta educacional que o sustenta, assim como comprometimento, sentimento de pertença e identidade com a instituição. Instrumentos de diagnóstico e diversos recursos são utilizados para estabelecer critérios e prioridades claras para a proposta.

Maryann Thompson abordou questões relativas à sustentabilidade como aproveitamento da luz solar, ventilação natural e aproveitamento de recursos naturais; diálogo e incremento do fluxo de comunicação; capacidade de expressão e acolhimento da individualidade. Uma instalação sustentável deve ser considerada não apenas como paradigma arquitetônico, mas, também, como espaço de aprendizagem.

A valorização do ambiente como elemento de aprendizagem não é recente em teorias educacionais. Na década de 40, o educador e psicólogo italiano Loriz Mallaguzzi trouxe a abordagem de que criança se desenvolve por meio de interações em três dimensões: com os adultos que fazem parte de seu convívio, com seus pares e com o ambiente. Responsável pela abordagem educacional das escolas de Reggio Emilia, considerada referência mundial em Educação Infantil, destacou o ambiente como o terceiro professor. O que se viu nesse programa é a aplicação dessa conceito nas diferentes faixas etárias da educação básica.

A experiência multicultural e multidisciplinar proporcionada por esse encontro trouxe um novo repertório para todos os participantes. Educadores, arquitetos e designers interagiram e buscaram novas soluções para espaços educacionais destinados a crianças e jovens. Compreenderam, com mais profundidade, o que disse Jonathan Levi: “O ambiente que as crianças ocupam são as experiências que desenharão o nosso futuro. A arquitetura da educação é a arquitetura do futuro.” Ainda: “As construções são as roupas que vestimos em nossa comunidade.”

Sob a perspectiva educacional, nós, educadores, temos que quebrar nossas paredes internas, continuar repensando nossas práticas em função da concepção de ensino e aprendizagem e entender, com mais profundidade, o espaço escolar como parte do currículo escolar. Bela lição de casa!

 

Ponto de Vista
Esther Carvalho
Diretora-Geral do Colégio Rio Branco